sexta-feira, 31 de julho de 2009

O que é um SER ÉTICO?

Numa sociedade organizada criam-se normas fundamentais nas relações cotidianas como, por exemplo: não deves matar, não deves mentir, não deves enganar, cumpre tuas promessas, não causes o sofrimento. Tais normas aprendemos desde crianças tornando-as parte do que chamamos consciência. Ao longo do tempo o ser humano passa da irreflexão dos seus hábitos, da heteronomia, para uma moral refletida e autônoma. A partir desse processo, saímos da menoridade para a maioridade, pois usamos nossa própria razão para as ações serem regidas no pleno livre-arbítrio e na responsabilidade individual. Não somos mais movidos por leis externas, mas agora o homem é capaz de autodeterminação, distanciando-se doravante dos impulsos e dos mecanismos instintivos.

Apesar dos condicionamentos naturais, desde os mais elementares e inerentes à sua existência, o homem pode reagir, pois ele se pergunta “o que devo fazer?”. Nisso ocorre sua autodeterminação, e que por sua vez responsabiliza-se pelas conseqüências de suas decisões. Mas qual a resposta do pressuposto interior ‘o que devo fazer’? Ora, conseguimos deduzir normas exclusivamente pela razão frente aos desafios da existência. Por conseguinte, o sujeito torna-se capaz de ditar normas para si após transformá-las num critério de validade geral, ou seja, universalizando-as. Por isso o filósofo alemão, Immanuel Kant (1724-1804) afirma: “Age somente de acordo com aquela máxima através da qual possas querer simultaneamente que se torne uma lei universal e necessária.” (Metafísica dos Costumes).

Não obstante, o termo ética designa-se, pois, a ciência do agir responsável do homem e essa ação consciente deve ser baseada na liberdade, nunca de maneira coercitiva. Por moral entendemos as ações praticadas por hábito e os costumes em geral, isto é, a parte prática dos princípios universalizados. A ética, por sua vez, analisa a dimensão pessoal da ação, mostrando o modo como o agir parte da própria razão da pessoa que age, por isso, que a ética é o fundamento da moral. Pela observação da ciência da moral descrevemos as normas que nos orientam e que também podem evoluir conforme o progresso ou retrocesso das ações humanas.

Do mesmo modo a indagação pelo dever, pelo que é o certo ou o errado não pode ser respondido por hipóteses ou tradições, num sentido vertical ou autoritário, mas pela racionalidade humana, de uma justificação horizontal. Visto ser a razão a essência característica do homem, realiza ele a sua natureza vivendo racionalmente e por isso consciente de si e do universo. Como afirmara o grande filósofo grego Aristóteles (384-322 a.C.), a virtude é uma atividade conforme a razão, isto é, uma atividade que pressupõe o conhecimento racional.

Ademais, as normas do agir humano não decorrem da própria natureza, nem são descobertas por métodos empíricos [experimentais], mas são um produto da razão autônoma. Conseqüentemente seria dispensável falar em ética se o homem conduzisse sua vida conforme a própria natureza instintiva e estivesse determinado totalmente pelas leis naturais. Entretanto, poderíamos continuar a afirmar leis naturais para o agir humano depois de Charles Darwin? Ora, a luta pela vida com a vitória e a seleção dos melhores, das espécies mais fortes, se aplica hoje ao neoliberalismo econômico e social. O Humano não pode ser regido pela lógica das leis naturais.

O objeto da ética é o agir humano responsável, segundo o qual, o homem conduz sua vida para o bem viver, ao encontro de sua felicidade. Todavia muitas decisões e reações são instintivas e inconscientes, o que leva ao passo da reflexão crítica de nós mesmos, ou seja, a autocrítica que emerge quando desaparecem as evidências em como agir, buscando novos parâmetros. O fato é que o sistema social vigente perdeu sua auto-evidência moral, as instituições tradicionais perderam sua autoridade e legitimação, os quais não implicam mais um dever ser.

O conceito de bem, seja o privado e/ou coletivo necessita ser novamente revisitado e reavaliado, não mais de forma artificial, simplista e intolerante, que por tempos descartou as dimensões da pessoa humana, mas pautado no reconhecimento da humanidade, como aquele conjunto de seres que convergem mutuamente e concorrem para o bem estar do homem na terra. Devemos visar mais do que nunca uma moral que leve ao autoconhecimento, baseada no altruísmo, isto é, o viver para outrem, o ser útil a outro ser. Nisto consiste o ser humano, um ser aberto que supera o âmbito da natureza e da animalidade, para ser pessoa. Alcançamos a realização deste desígnio através da ética. Nem ser pessoa, nem ser humano, nem a ética, são dados prévios ou inscritos em alguma natureza pronta e também não são conquistados e cumpridos plenamente. É o empenhar-se, apropriar-se, desconstruir-se, amadurecer eticamente para tornar-se realmente humano.

Diego Losekam da Cunha